Vinhos da Borgonha que cabem no bolso? Conheça a denominação Bourgogne AOC

A região francesa da Borgonha certamente contém as mais valorizadas áreas de vinhedos do planeta. Tem uma classificação hierárquica de seus vinhedos e vinhos sem igual no mundo, com nada menos que 33 Climats classificados como Grand Crus e cerca de 640 como Premier Crus. No entanto, quem está começando a consumir ou não pode pagar tão caro pelos vinhos acaba optando por alternativas distintas (e mais acessíveis) na Borgonha.

E a principal porta de entrada para os vinhos desta região fica na denominação de origem Bourgogne AOC, uma das líderes em produção da região. Apesar de ser a mais popular, o que pouca gente sabe é que ela não é a denominações de origem com os vinhos mais básicos ou regras mais flexíveis da região. Existe a denominação de origem Coteaux Bourguignons, mas ela acaba sendo mais rara, pois conta com cerca de 10% da área de vinhedos da Bourgogne AOC.  

Bourgogne AOC

A Appellation d’Origine Contrôlée Bourgogne (ou Bourgogne AOC) foi uma das primeiras criadas na região, dentro da classificação de vinhos lançada em meados da década de 1930 pelas autoridades francesas. Oficialmente criada em 1937, a Bourgogne AOC atualmente conta com uma área de vinhedos de 2.653 hectares, com produção de vinhos tintos, brancos e rosés.

Os vinhedos estão distribuídos pelas quatro principais áreas da Borgonha, ou seja, os quatro départments (unidades administrativas francesas) que compõem a região. Eles vão desde o norte da Borgonha, como Yonne (que inclui Chablis), passando por Côte d’Or e Saone-et-Loire até chegar ao Rhône, que é como o départment que contém o Beaujolais é oficialmente chamado. No total, são mais de 380 communes (espécie de municípios), como pode ser visto no mapa abaixo.

Rhône e Beaujolais?

Apesar de fazer parte da Borgonha, esta última região pode causar certa confusão, pois Rhône poderia remeter aos vinhos elaborados com Syrah, Grenache, Viognier ou Cinsault produzidos mais ao sul. Neste caso, Rhône é apenas o nome administrativo desta parte da Borgonha, não incluindo áreas como Côtes du Rhone, Hermitage ou Côte-Rôtie, por exemplo.

No entanto, é neste “Rhône” que se situa o Beaujolais, região conhecida pelos vinhos elaborados a partir da uva Gamay. Curiosamente, os produtores do Beaujolais, desde que tenham vinhedos nos chamados Crus de Beaujolais, podem classificar os vinhos com uvas destas áreas como Bourgogne AOC. Porém, isso não faz muito sentido, pois as classificações dos Crus da região (Morgon, Fleurie, etc) são hierarquicamente superiores à Bourgogne AOC. O que ocorre, porém, é que existem négociants da Borgonha ativos na área e que elaboram vinhos combinando uvas de vários Crus, que acabam sendo rotulados como Bourgogne AOC, mas destacando a uva Gamay (vide exemplo abaixo).

Uvas usadas

As principais uvas utilizadas para a grande maioria dos vinhos da Bourgogne AOC são a Pinot Noir e Chardonnay, que devem compor ao menos 70% do vinho desta denominação de origem. Caso o produtor opte por incluir o nome da uva, esta proporção deve subir para um mínimo de 85%. Por exemplo, um rótulo que inclua Bourgogne Pinot Noir deve ter ao menos 85% desta variedade.

Porém, existem duas exceções. Uma delas acaba ficando com os vinhos elaborados a partir da Gamay, que, como detalhado acima, devem ser originários dos vinhedos Cru de Beaujolais. Neste caso, a proporção mínima de Gamay deve ser 85% e o vinho pode ser rotulado como Bourgogne Gamay. É importante não confundir os vinhos desta denominação de origem com aqueles da AOC Bourgogne Passe-Tout-Grains, que incluem cortes de Pinot Noir e Gamay (neste caso as uvas podem vir de diversas regiões da Borgonha).

A segunda exceção é que também existem vinhos classificados como Bourgogne AOC elaborados a partir de Pinot Blanc, embora eles sejam bastante raros. Além destas uvas principais, existe também a permissão para usar o que os borgonheses chamam de “uvas acessórias”. Elas podem compor uma parcela inferior a 30% do corte. As uvas acessórias são Pinot Gris para vinhos brancos e Chardonnay, Pinot Blanc, Pinot Gris e César para tintos e rosés.

Requisitos mínimos

Existe uma série de requisitos mínimos para que os vinhos possam receber esta classificação. Por exemplo, há um teor mínimo de álcool, que deve ser de 10,2% para tintos e rosés e de 10,5% para os vinhos brancos. Curiosamente, existe também uma graduação máxima, de 13,2% para os tintos e rosés e de 13% para os brancos.

O rendimento por hectare também é regulamentado. Ele é limitado a 60 hectolitros por hectare para vinhos tintos e rosés (ou 69 hl incluindo a reserva técnica) e 68 hectolitros para os brancos (75 hl com a reserva técnica). Caso os vinhos não cumpram estes requisitos mínimos, tendem a ser desclassificados, passando para a denominação Coteaux Bourguignons.

Área de produção e indicações geográficas

Por ser uma denominação de origem regional, os vinhedos estão espalhados pelas quatro áreas da Borgonha. No entanto, boa parte dos vinhedos se situa em áreas mais planas (sendo as áreas em encostas normalmente classificadas nas categorias superiores) ou em locais com orientação norte ou oeste.

Vale destacar que esta denominação de origem não inclui os vinhos feitos na mesma região a partir de outras uvas ou processos distintos (como Bourgogne Aligoté, Bourgogne Passe-Tout-Grains, Bourgogne Mousseux ou Crémant de Bourgogne). Também estão segregados os vinhos elaborados a partir de denominações regionais com indicações geográficas complementares, como Hautes-Côtes-de-Nuits, Bourgogne Côte d’Or ou Macon, por exemplo.

Características e vinhos

Por conta da localização menos privilegiada de seus vinhedos, por muitos anos os vinhos desta denominação de origem mostraram enormes variações de safras. Isso por vezes resultou em vinhos de qualidade contestável. No entanto, por conta do aquecimento global, a qualidade dos vinhos produzidos mostrou um importante salto nas últimas safras. Para isso, contribuíram também os avanços nas práticas agrícolas e de elaboração.

De forma geral, os tintos são vinhos mais frescos e frutados que os de denominações de origem consideradas mais nobres, com um potencial de guarda entre três a cinco anos. Já os brancos também deram um salto qualitativo nos últimos anos, ganhando mais estrutura e maior presença de fruta. Assim, podem aparecer como boas opções para quem quer começar a conhecer os vinhos da Borgonha, embora do ponto de vista de preço muitas vezes mostrem uma relação desfavorável frente a regiões fora da Borgonha.

Fontes: Vins de Bourgogne; Wine Scholar Guild; The World Atlas of Wine, Hugh Johnson

Mapas: INAO

Imagem: Sylvain Brison via Unsplash

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