O Vale do Loire, sobretudo na sua parte ocidental, é considerado por muitos como o limite da viticultura da França, por conta de sua latitude. No entanto, existe um outro rio, ainda mais ao norte do Loire, que merece este título. Ele é o Loir (sem o “e” mesmo), às margens do qual se situam três denominações de origem. Delas, a menor e que possivelmente chama mais a atenção é Jasnières.
Situada na margem direita do Loir, a cerca de 40 quilômetros a norte de Tours, é uma região onde a Chenin Blanc reina soberana. Por ser uma área relativamente pouco conhecida, ao longo dos anos tem sido comparada com outras regiões de maior visibilidade. Alguns autores se referem a ela como a Savennières da Touraine, levando em conta a qualidade de seus vinhos e o seu foco na Chenin Blanc. Já Jacqueline Friedrich, escritora norte-americana especializada nos vinhos do Loire, faz uma comparação ainda mais específica. Para ela, se Savennières é o Rheingau, Jasnières seria o Mosel.
Papel das ordens religiosas
As primeiras menções históricas aos vinhos das margens do Loir datam do século VI. Foi nesta época que Saint Lézin, na época bispo de Angers, teria plantado as videiras pioneiras. O monastério fundado posteriormente e que recebeu o nome do santo teria sido responsável pelo desenvolvimento dos vinhedos no vale do Loir.
No coração deste vale, os monges identificaram três encostas de orientação sul em Jasnières, onde as uvas, possivelmente Chenin Blanc, teriam se adaptado muito bem. Além disso, a facilidade para escavar os solos da região para construção de adegas seria um importante diferencial, algo que segue até hoje, como ilustrado na imagem desta matéria.
Vinhos de qualidade
Desde o século XVI, há constantes menções aos vinhos brancos do Loir. Rabelais, em sua obra Pantagruel, aponta que a comuna de La Chartre, localizada no coração do vale do Loir e aos pés das encostas de Jasnières, estava repleta de comerciantes de vinho. O poeta Ronsard enalteceu os vinhos de Loir, enquanto o rei Henri IV, ao provar os vinhos de Jasnières em uma vista à região, demandou que eles fossem servidos no seu castelo real, em Saint-Germain-en-Laye.
Jules Guyot detalhou a região e seus vinhos em seu Etude des Vignobles de France (1876). “O clima de Sarthe pertence àquela parte da zona temperada onde os frutos doces adquirem o máximo de sua finesse, as uvas são deliciosas e os vinhos produzidos notáveis”. Foi na mesma época que os vinhos brancos de Jasnières ganham mais popularidade. Curnonsky, conhecido crítico gastronômico do início do século XX, exaltou a qualidade “Três vezes por século, Jasnières é o maior de todos os vinhos brancos do mundo”.
A denominação de origem e seu terroir
Inicialmente nome deste lieu-dit com três colinas próximas do vilarejo de Lhomme, Jasniéres recebeu aprovação como denominação de origem em 1937, a primeira no Vale do Loir. Sua área está distribuída entre duas comunnes, Ruillé-sur-Loir e Lhomme, com uma posição geográfica única. É uma encosta de cerca de 300 metros de largura na margem direita do Loir, intercalada por três vales e protegida dos ventos do norte pela floresta de Bercé.
As parcelas delimitadas para o cultivo de uvas localizam-se na parte mais íngreme desta encosta. São declives da ordem de 15%, com altitudes que variam entre 70 a 120 metros. Os solos são ralos e pedregosos, e se aquecem rapidamente, uma vantagem em uma região tão ao norte. Em termos geológicos, são solos ricos em formações de tufa turoniana (alta proporção de calcário) e argilas de sílex senonianas.
O clima na denominação Jasnières pode ser descrito como oceânico degradado, combinando influências oceânicas e continentais. O rio Loir atua como um regulador térmico, assim como os vales que drenam o ar frio da encosta. É uma região relativamente seca, com precipitações na ordem de 680 milímetros/ano.
Área cultivada, produção e estilo
Em 2019, Jasnières contava com uma área total de 128 hectares, dos quais cerca de 75 deles estavam plantados com vinhedos. A título de comparação, isso é cerca de 10% superior às três denominações de origem que compõem Savennières. A produção total média entre 2015-19 foi de 2.085 hectolitros, o que corresponde a aproximadamente 280 mil garrafas.
A única uva permitida é a Chenin Blanc, foco das atividades de cerca de 25 vinicultores que atuam na região. Embora vinhos doces e semi-doces sejam legais pelas regras da denominação de origem, a grande maioria da produção é de vinhos secos. São vinhos que refletem muito bem as características da Chenin Blanc, com coloração amarelo brilhante, aromas de flores brancas, frutas tropicais, mel e notas minerais, além de alta acidez e grande potencial de guarda.
Principais produtores
Dentre os produtores baseados na região, um se destaca: a Domaine Bellivière, liderada por Eric Nicolas. Outros produtores que merecem destaque na região, alguns dos quais elaborando seus vinhos como Vin de France, são: Domaine le Briseau, Les Vignes de l’Angevin, Maison Rouges e La Roche Bleue.
Fontes: Loire Master Level Study Manual, Wine Scholar Guild; The Wine Doctor; Cahier des Charges de L’appellation d’origine Jasnières; Loire Valley Wine Economic Report, Vins de Loire – appelation Jasnières
Imagem: Domaine Lelais – ®P. Beltrami
Mapas: Vins du Val de Loire
O post Jasniéres: conheça a fronteira norte do Loire e seus Chenin Blanc apareceu primeiro em Wine Fun.