Muitos brasileiros que apreciam vinho tem um destino certo quando visitam os Estados Unidos. A Total Wine & More é um verdadeiro gigante do comércio varejista de vinhos e outras bebidas alcóolicas, com faturamento de cerca de US$ 5,5 bilhões em 2022. São 264 lojas em 28 estados norte-americanos, incluindo 41 na California e 39 na Florida, locais habitualmente visitados por brasileiros.
Confesso que na primeira vez que visitei uma de suas lojas, há mais de 30 anos, fiquei fascinado com a quantidade e diversidade de vinhos disponíveis. Porém, ao longo de tempo, por conta de meu crescente interesse por vinhos de produtores mais artesanais, identifiquei outras opções muito mais adequadas ao meu paladar. No entanto, sempre tive vontade de voltar, até para entender melhor o que esta varejista gigante pode oferecer.
Máquina do tempo?
Foi uma verdadeira viagem ao passado visitar uma loja da Total Wine, neste caso no sul da California, próximo a San Diego. De forma geral, com algumas exceções, encontrei exatamente o que tinha na memória. Como novidades, observei o crescimento da disponibilidade de outras bebidas alcóolicas, com uma ampla oferta. Já no vinho, observei um espaço importante para vinhos sem álcool e, também, para vinhos mexicanos, obviamente não disponíveis há 30 anos.
E quais são as percepções que eu tinha da Total Wine que confirmei nesta visita recente? A seleção de vinhos da loja ainda parece refletir os tempos quando Robert Parker era a voz mais ouvida no mundo do vinho. Como poderia se esperar, há uma seleção enorme de vinhos norte-americanos. Existe uma grande concentração em duas uvas: Cabernet Sauvignon e Chardonnay, com as demais em segundo plano. Os produtores de grande porte dominam a seleção, com espaço mínimo para vinícolas mais artesanais.
E quanto aos vinhos estrangeiros? Também nesta parte a seleção remete aos anos 1990 e 2000. A região fora dos Estados Unidos melhor representada segue sendo Bordeaux, possivelmente com mais rótulos disponíveis do que todas as demais regiões francesas somadas. Na Itália, um pouco da mesma dinâmica: a Toscana, com destaque para os Supertoscanos, segue na liderança, com a oferta de Prosecco e Pinot Grigio também chamando a atenção.
Não está faltando algo?
Mais do que excessos, o que mais me chamou atenção foram as ausências. Borgonha é um bom exemplo, com uma seleção muito pobre, com foco em négociants e produtores de maior escala, com pouquíssimas opções interessantes. Claramente quem montou a seleção não dá muita importância para a Borgonha ou não se esforçou o suficiente para representar a região que atualmente é responsável pelos vinhos mais disputados do mundo.
Ainda na França, com exceção de Bordeaux e algumas alternativas interessantes das regiões de Champagne e Rhône, mais do mesmo. Pequena oferta de vinhos, concentrada em produtores de grande porte, quase sem atrativos. Algumas regiões, como o Jura, sequer parecem existir nesta loja. No mesmo dia visitei um supermercado na mesma região que tinha uma oferta mais diversificada de vinhos franceses.
Algumas denominações de origem incríveis da Itália, como Barbaresco ou Etna, quase não tinham representantes. Mesmo para Barolo a oferta era pobre e concentrada em poucos produtores. Para Espanha, sobretudo Rioja, a escolha era melhor, com vinhos de maior produção da López de Heredia e La Rioja Alta presentes. Alemanha, por sua vez, parecia ser um país sem produção de vinhos, tamanha a escassez.
Questão de gosto pessoal
Minha conclusão: meu gosto pessoal não combina com o da Total Wine. Se fiquei vários anos sem visitar suas lojas, me parece que a próxima visita demorará ainda mais. Mas isso não significa que ela seja uma opção ruim para todos. Quem aprecia vinhos e produtores que viveram seu auge na época quando Robert Parker dava as cartas, encontrará muitas opções.
Aliás, chamou também a atenção a quase obsessão com vinhos pontuados ou premiados, segregados em áreas “premium”. Porém, como deixou claro Renato Nahas em coluna recente aqui no WineFun, alguns rankings ou pontuações soam, no mínimo, bizarros. E são estes, como aquele da Wine Spectator, que a Total Wine parece mais destacar. Portanto, para quem ainda segue este tipo de ranking, está aí uma loja que fala a mesma língua. Já para quem pensa diferente, vale a pena procurar outras opções no enorme mercado norte-americano de vinhos. Alternativas não faltam.
Como eu me descrevo? Sou um amante exigente (pode chamar de chato mesmo) de vinhos, um autodidata que segue na eterna busca de vinhos que consigam exprimir, com qualidade, artesanalidade, criatividade e autenticidade, e que fujam dos modismos e das definições vazias. A recompensa é que eles existem, basta procurar!
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Foto da capa: Arquivo pessoal
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