Barolo e Barbaresco, duas das denominações de origem mais prestigiosas da Itália, estão propondo mudanças em algumas de suas regras de produção, engarrafamento e comercialização. O objetivo é permitir maior flexibilidade aos seus produtores e fazer frente a alguns dos principais desafios atuais da viticultura, entre eles o aquecimento global.
Em meio ao seu evento anual com profissionais do vinho de todo o mundo, chamado Grandi Langhe, o Consorzio di Tutela Barolo Barbaresco Alba Langhe e Dogliani apresentou algumas propostas de mudanças nos regulamentos das denominações Barolo e Barbaresco. Destas, três das propostas do grupo que une os produtores locais chamam a atenção e merecem uma análise mais detalhada.
Driblando o aquecimento global
Uma das propostas mais aguardadas é a eliminação da proibição de plantar vinhedos com a variedade Nebbiolo, tanto em Barolo como Barbaresco, nas encostas de orientação norte. Se no passado (esta proibição data de 1966) isso poderia resultar em uvas menos aptas para a produção de Barolo ou Barbaresco, isso mudou completamente. Maiores temperaturas médias e climas mais secos garantem atualmente condições muito mais adequadas de maturação nestas áreas.
Vale lembrar que esta proposta não implica na ampliação da área de vinhedos destas denominações de origem. Por conta da proibição, os vinhedos de face norte vêm sendo plantados com outras variedades, sobretudo Dolcetto e Barbera. O fim da proibição, deste modo, abre a possibilidade de aumentar a parcela de Nebbiolo na região, em detrimento das outras variedades.
MGAs comunais também no Barbaresco
Atualmente, Barolo conta com 181 MGA (Menzione Geografica Aggiuntive) usadas para diferenciar seus diferentes terroirs. Destas, 170 se referem a vinhedos ou sub-regiões específicas e 11 a cada uma das Comune (municípios) que tem vinhedos dentro da área delimitada da denominação de origem. Em Barbaresco, porém, a legislação criada em 2007 permite 66 MGAs por vinhedos ou sub-região, sem MGAs comunais.
Deste modo, a mudança proposta permitiria a criação de mais três MGAs, cada uma para os três comune da Barbaresco DOCG: Barbaresco, Neive e Treiso. O produtor ganharia a opção de engarrafar os vinhos, deste que as uvas sejam provenientes do mesmo município, usando o nome do comune. Um exemplo seria Barbaresco del Comune de Neive, assim como já ocorre nos vinhos comunais da denominação de origem Barolo.
Reciprocidade entre Barbaresco e Barolo
Atualmente, com exceção de casos específicos já existentes antes da criação das denominações de origem da região em 1966, existem severas restrições à vinificação e engarrafamento de vinhos tanto em Barolo como Barbaresco. Por exemplo, mesmo que as uvas sejam 100% provenientes de Barolo, caso seja vinificado ou engarrafado fora das 11 comune da denominação de origem, o vinho não pode ser engarrado como Barolo.
A proposta do Consorzio considera a reciprocidade entre Barolo e Barbaresco para vinificação e engarrafamento. A emenda, caso aprovada, permitirá que um Barolo seja vinificado e engarrafado na área de produção de Barbaresco. Da mesma forma, um Barbaresco pode ter vinificação e engarrafamento na área de produção de Barolo, com exceção dos territórios localizados no lado esquerdo do rio Tanaro. Houve também uma proposta de menor relevâncioa, que permite o engarrafamento de vinhos, tanto de Barolo como Barbaresco, em garrafas com capacidade superior a seis litros.
Longo processo
As alterações propostas somente serão consideradas se houver aprovação por parte dos produtores. Ou seja, precisam votar “sim” o equivalente a 66% da área total das vinhas sujeitas à declaração de produção e 51% da produção engarrafada nos últimos dois anos. O processo de coleta de assinaturas começa em fevereiro e deve se estender por dois meses, passando, posteriormente para aprovação pelas autoridades regionais, nacionais e da União Europeia.
Em entrevista exclusiva para WineFun, o presidente do Consorzio di Tutela Barolo Barbaresco Alba Langhe e Dogliani, Matteo Ascheri, se mostrou otimista com o processo de aprovação. A questão principal, porém, é a duração do processo, que pode se estender entre dois a três anos.
Grandi Langhe e interesse estrangeiro
Ascheri destacou também o sucesso da Grandi Langhe, evento anual que reúne os produtores da região. Foram 300 produtores participando, sem contar os 40 que ficaram na lista de espera, sem espaço para expor seus vinhos. Realizada em Torino e com duração de dois dias, atraiu cerca de 5.000 visitantes de todo o mundo.
O presidente do Consorzio também tocou em um assunto crítico: o crescente interesse de investidores estrangeiros na aquisição de vinícolas na região. Ascheri coloca a questão em dois pontos básicos. Em primeiro lugar, a decisão de vender instalações, marcas ou vinhedos cabe a cada vinícola individualmente. Porém, ele ressalta que isso pode trazer impactos negativos para Barolo e Barbaresco. Não há como negar que sucesso da vinicultura na região está ligado intrinsicamente à existência de um modelo baseado em diversas pequenas propriedades familiares. De forma sugestiva, o título de sua palestra era Langhe (not) for sale.
Fontes: Consorzio di Tutela Barolo Barbaresco Alba Langhe e Dogliani; Entrevista com Matteo Ascheri
Imagem: Arquivo pessoal
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