O mundo do vinho nos traz a oportunidade para conhecer muita gente interessante. E, dentre elas, algumas com hábitos peculiares. Por exemplo, por muito tempo frequentei uma confraria na qual um membro tinha uma “dieta” peculiar. Onde quer que fizéssemos o encontro e independentemente do tipo de vinho degustado, o prato pedido era sempre o mesmo.
“Um bife à parmegiana, por favor!” era a frase ouvida em todos os encontros. Obviamente motivo de estranheza para alguns (sobretudo os chefs dos restaurantes, já que raramente este prato fazia parte do cardápio), era, na minha visão, uma forma legítima de expressão. Afinal de contas, cada um tem o direito de comer o que mais lhe convém. Quem sou eu (que nem nutricionista sou) para opinar sobre os hábitos alimentares de alguém.
A síndrome no mundo do vinho
A tal “síndrome da Parmegiana” não se resume somente aos hábitos alimentares deste amigo. Aliás, infelizmente não o vejo há tempos pois, por conta da crescente violência por aqui, decidiu se mudar para o exterior. Cada dia mais as pessoas têm mostrado menos diversidade em suas escolhas, privilegiando o que realmente as agrada. Em paralelo, porém, fecham a porta para novas experiências.
E isso, obviamente, ocorre também na escolha de vinhos. E neste caso, podemos chamar o fenômeno mais comum de “síndrome da não Parmegiana”. São poucas as pessoas que focam exclusivamente em um tipo de vinho, até porque o universo de vinhos e estilos é quase infinito. O mais comum é “não gosto e não peço” um vinho ou estilo em particular.
Malbec argentino? Vinho nacional? Vinho com passagem em madeira? Riesling? Vinhos do Novo Mundo? Vinho natural? Vinho com sulfitos? Vinhos mais maduros? Em todas estas indagações conheço ao menos uma pessoa que deixa claro que não gosta, não negocia e, portanto, não consome. Algum problema em relação a isso? Honestamente não, cada um tem o direito de beber o que mais lhe agrada, é uma escolha pessoal como qualquer outra. Desde que não prejudiquem alguém, as pessoas são livres para tomar suas decisões.
E o influenciador?
Talvez uma limitação a este raciocínio surja quando estamos falando de um crítico de vinhos ou, na linguagem mais moderna, influenciador. Eu fico pensando o que seria seguir um crítico de gastronomia que come somente bife à Parmegiana. Será que o seu horizonte e repertório não seriam limitados demais para esta tarefa? Obviamente não, se ele decidisse escrever o “Guia do bife à Parmegiana”.
Voltando ao mundo do vinho, acredito que, independentemente de gostos pessoais, quem assume a posição de “influenciador” deve ter sempre um horizonte aberto. Caso contrário, corremos o risco de fecharmos as portas para muita coisa interessante. Confesso que também tenho meus “bifes à Parmegiana” e meus “não bifes à Parmegiana”, mas sempre busco quebrar os paradigmas. Por exemplo, até hoje não tomei um Carmenére que tenha me agradado plenamente. Mas sigo na busca, seria fácil demais falar “detesto esta uva”. Estou na esperança de identificar um vinho que me faça perder este preconceito.
Direito de escolha, mas com portas abertas
Em resumo, nada contra quem deixa suas preferências claras e tem a coragem de trazer seus gostos de forma transparente para todos. Cada um tem o direito de apreciar (obviamente dentro dos limites da ética) o que quer. Nada contra quem só gosta de Pinot Noir, Malbec extraído, Chardonnay da Borgonha, Supertoscano ou bife à Parmegiana. Mas, por outro lado, não tenho dúvida que a curiosidade intelectual e abertura às novas ideias, conceitos (e vinhos também) fazem a humanidade avançar mais rápido.
Como eu me descrevo? Sou um amante exigente (pode chamar de chato mesmo) de vinhos, um autodidata que segue na eterna busca de vinhos que consigam exprimir, com qualidade, artesanalidade, criatividade e autenticidade, e que fujam dos modismos e das definições vazias. A recompensa é que eles existem, basta procurar!
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Foto: Alessandro Tommasi, arquivo pessoal
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