A safra 2019 foi relativamente controvertida na Borgonha. Há quem a coloque como uma safra mais “clássica”. Embora o ano tenha sido de muito calor, ela não teria trazido os excessos de fruta madura vistos em 2018 e 2020, com vinhos trazendo mais acidez e tensão. Por outro lado, diversos críticos a consideram não tão diferente destas duas, fugindo do que seria o padrão da Borgonha antes do impacto do aquecimento global.
Para avaliar alguns vinhos desta safra, optamos por organizar duas degustações com vinhos da denominação de origem Bourgogne. A seguir, a descrição da primeira delas, com oito vinhos.
Bourgogne Pinot Noir 2019, Domaine Prunier-Bonheur 13,5%
Pinot Noir elaborado a partir de vinhas velhas de 45 anos e cultivo sustentável, em vinhedo de orientação sul em Pommard. Na vinificação, uso parcial de engaço, maceração a frio, leveduras indígenas em fermentação de 15 a 21 dias.
Um vinho mais leve e delicado, com coloração rubi de baixa concentração e olfativo marcado por aromas de frutas frescas (framboesa) e especiarias. Na boca, um Pinot Noir elegante e com taninos finos, de alta acidez e corpo médio-baixo. Quase um estilo glou glou, com fruta vermelha leve e fresca no palato, trouxe também as características notas ferrosas de Pommard.
Coteaux Bourguignon 2019, Robert Gibourg 13,5%
Já provado anteriormente, este vinho entrou no painel por sua qualidade, mesmo sendo de uma denominação de origem considerada inferior. Foi elaborado com uvas de cultivo sustentável, proveniente de videiras plantadas entre 1970 e 1975 no climat Les Pertuisées, em Morey-Saint-Denis. Na adega, maceração pré-fermentativa, seguida por fermentação com cachos inteiros, com leveduras indígenas em cuba de inox, onde o vinho ficou 10 meses e foi engarrafado sem filtração, colagem ou adição de sulfitos.
Um vinho delicioso e levemente “selvagem”. Coloração rubi de média intensidade, trouxe no olfatvo leve nota de acidez volátil, sem esconder aromas de frutas picantes, leve químico, floral (violeta) e discreto brett. No palato, mostrou alta acidez, taninos picantes, muito frescor e vivacidade, com fruta bem pura.
Bourgogne Rouge La Taupe 2019, Domaine Chavy-Chouet 12,7%
La Taupe é um vinhedo de 2 hectares, com vinhas velhas (+70 anos) nas proximidades do Château de Pommard. As videiras são de cultivo sustentável e, na vinificação, as uvas passaram por fermentação em carvalho, com leveduras indígenas. O vinho fez estágio de 10 meses em barricas, dos quais 10% novas.
Outro Bourgogne Rouge com uvas provenientes de Pommard, que mostrou sua tipicidade, porém com mais intensidade e matiére. No visual, trouxe coloração rubi média a alta, com o nariz marcado por aromas mais intensos de frutas maduras, com notas de madeira, toque terroso e ferro. Na boca, um Pinot Noir de boa acidez, corpo médio a alto e taninos mais rústicos.
Bourgogne Pinot Noir 2019, Agnes Pacquet 13,5%
Um dos vinhos do painel elaborado com uvas fora das denominações mais tradicionais da Côte d’Or. As uvas, de cultivo sustentável, são provenientes de vinhas de 30 a 35 ano plantadas em Meloisey, nas Hautes Côtes de Beaune. Na vinificação, fermentação em três tanques de cimento, dois terços de uvas desengaçadas, um terço com cachos inteiros, com uso de leveduras indígenas. Após assemblage, o vinho fez estágio de 90% em inox e 10% em carvalho novo.
O vinho mais delicado e elegante do painel, sem abrir mão de concentração ou textura. No visual trouxe coloração rubi mais violáceo de média concentração, com olfativo sedutor, com destaque para notas florais (rosa). No palato, acidez alta, taninos sedosos e corpo médio, um Pinot delicioso, fresco e de boa profundidade.
Bourgogne les Crays 2019, Julien Guillot 13,5%
Julien Guillot é um dos grandes nomes do vinho do Mâconnais, adotando um estilo bastante autoral. No caso deste vinho, as videiras, provenientes de Mâcon, têm cerca de 40 anos e cultivo biodinâmico. Na adega, houve uso de maceração semi-carbônica com cachos inteiros, leveduras indígenas e estágio de 12 meses em barricas usadas. O engarrafamento ocorreu sem sulfitos, filtração ou colagem.
O vinho mais “selvagem” do painel, daqueles Bougogne regional que podem agradar ou não diferentes perfis de degustadores. No visual, mostrou acidez volátil acima do meu limiar, ocultando parte das notas de frutas picantes, especiarias doces (bem típicas de maceração carbônica) e engaço. Na boca, a volátil também se vez presente, com muito frescor, corpo médio, taninos elegantes e fruta de alta gama.
Bourgogne Grands Champs 2019, Pierre Naigeon 13,5%
Outro produtor de baixíssima intervenção, porém que conseguiu aliar muita pureza de frutas, tensão e equlibrio. O vinho foi elaborado com uvas de agricultura orgânica certificada provenientes de Gevrey-Chambertin. Na vinificação, uso exclusivo de leveduras indígenas, com estágio de nove meses em carvalho usado e engarrafamento sem sulfitos, filtração ou colagem.
Mostrou bem seu estilo e origem, com mais estrutura, taninos presentes e maior intensidade. No visual, se mostrou de coloração rubi violácea, com nariz marcado por aromas de cereja negra, notas florais, leve volátil e especiarias picantes. No gustativo, trouxe alta acidez, corpo médio e mais estrutura. Um vinho mais intenso e profundo, com discreto amargor, mas de excelente qualidade.
Bourgogne Rouge 2019, Michel Lafarge 13%
Para muita gente, Bourgogne Rouge é um tipo de vinho para consumo imediato. Alguns produtores, porém, parecem discordar e elaboram vinhos com claro potencial de guarda, que evoluem muito bem com o tempo. E não tenho dúvida em incluir Michel Lafarge entre eles. Este vinho contou com uvas de quatro diferentes parcelas em Volnay, incluindo vinhas velhas (plantadas entre 1966 e 1977). Na adega, fermentação de duas semanas com leveduras indígenas e o vinho, que conta com certificação orgânica e biodinâmica, passou por 18 meses em barris de carvalho usado.
Um vinho que mostrou suas credenciais, mas que precisa de tempo. Certamente foi o que melhor evoluiu depois de aberto. Coloração rubi de baixa a média concentração, com olfativo trazendo fruta madura (cereja e ameixa), com notas de madeira e florais. Na boca, alta acidez, taninos intensos, corpo médio, um vinho mais complexo e maior estrutura, com estilo mais tradicional.
Bourgogne Pinot Noir 2019, Paul Pillot 13,5%
Elegância é uma palavra que harmoniza perfeitamente com os vinhos de Paul Pillot. Este Bourgogne Rouge provém de vinhedos orgânicos não certificados, boa parte de vinhas velhas (idade média superior a 40 anos) em Chassagne-Montrachet e Santenay. Na vinificação, uso de 40% das uvas com cachos inteiros, fermentando com leveduras indígenas. O vinho passou por 18 meses em barris de carvalho, 15% novos e foi engarrafado sem filtração ou colagem, além de pequena adição de sulfitos.
Um vinho que chamou a atenção pela finesse e ótima estrutura de boca. Mostrou coloração rubi média a alta, com olfativo trazendo aromas de frutas mais maduras (cereja), com notas florais e de grafite. No palato, boa acidez, taninos finos, corpo médio, fruta bem presente, denso, equilibrado, leve toque de engaço. Um dos destaques do painel.
O post Bourgogne Rouge da safra 2019: primeiro flight apareceu primeiro em Wine Fun.