O estresse hídrico é uma ameaça cada dia mais real para videiras ao redor do mundo. Nos últimos anos, diversas regiões produtoras de vinho, como Europa, California e Austrália, mostraram menor volume de chuvas e temperaturas mais altas, afetando os vinhedos. O resultado? Seca generalizada e temores quanto ao impacto disso sobre as uvas e, consequentemente, sobre os vinhos.
A boa notícia, porém, é que tanto estudos científicos como a realidade dos vinhedos parecem mostrar que as videiras são mais resistentes à seca do que se pensava anteriormente. Em 2018, Sylvain Delzon, cientista do Instituto Nacional de Pesquisa Agronômica da França (INRA), divulgou um estudo sobre o tema e sua conclusão foi clara. “A videira tem um potencial maior de resistência à seca do que se pensava anteriormente e esta é uma mensagem bastante otimista”.
Do ponto de vista prático, a safra de 2022 confirmou os estudos de Delzon. Mesmo após um ano extremamente seco em boa parte da Europa, a safra acabou surpreendendo positivamente. Do ponto de vista de quantidade, a expectativa de perdas significativas não se concretizou. Já quando falamos de qualidade, ainda parece cedo para conclusões. Porém, certamente o pessimismo é bem menor do que pouco antes da colheita.
Os diferenciais das videiras
Em uma palestra recente realizada na Cité du Vin, em Bordeaux, Delzon apresentou dados de um novo estudo sobre o impacto da seca nas videiras. Embora tenha destacado as defesas naturais que a videira dispõe para enfrentar a falta de água, ele alertou para os riscos no futuro, sobretudo para regiões com regime mais irregular de chuvas. E, mais importante, trouxe evidências sobre quais variedades enfrentam melhor situações de seca.
Com longo histórico de cultivo em regiões com pouca chuva (como, por exemplo, o Mediterrâneo), três fatores favorecem as videiras no que diz respeito à falta de água. Em primeiro lugar, é uma variedade que tem raízes profundas, o que certamente favorece videiras velhas em situações de déficit hídrico. Um segundo fator é relacionado ao funcionamento dos estômatos das videiras, que são sensíveis e se fecham de forma precoce, evitando a desidratação da planta.
Por fim, a videira tem mais uma vantagem, por conta da sua segmentação hidrolítica. Em situações de seca, as videiras perdem suas folhas, exatamente as áreas de maior transpiração da planta. Isso funciona como uma espécie de “fusível”, mantendo a circulação da seiva e protegendo as áreas perenes e mais críticas da planta.
Variedades mais resistentes
Uma das grandes preocupações dos produtores em anos muito secos diz respeito à qualidade dos vinhos. Os maiores temores são referentes à perda de acidez e ao perfil menos intenso de fruta, além do menor potencial de guarda. Deste modo, saber quais variedades são as mais resistentes à seca pode fazer a diferença para quem aprecia um bom vinho.
Delzon analisou de forma detalhada 30 variedades, desde uvas tradicionais até variedades híbridas, as chamadas PIWIs. No grupo das menos resistentes, ordenadas de forma crescente pela sua capacidade de resistir à seca, aparecem as híbridas Floreal e Voltis, além de variedades mais conhecidas, como Trebbiano, Chardonnay e Cabernet Franc.
No grupo intermediário, diversas uvas de grande produção e alta reputação, como Carignan, Cinsault, Grenache, Sauvignon Blanc, Riesling e Tempranillo. Por fim, o grupo de variedades mais resistentes inclui Syrah, Sylvaner, Merlot, Cabernet Sauvignon e uma grande surpresa positiva. Apesar de ser considerada uma variedade de cultivo difícil, a Pinot Noir se mostrou a segunda uva mais resistente à seca, somente atrás da SO4, variedade americana usada como porta-enxerto.
Fontes: Les Vendanges du Savoir: La vigne et l’eau, quel stress!, Sylvain Delzon; Le Figaro
Gráfico: Les Vendanges du Savoir: La vigne et l’eau, quel stress!, Sylvain Delzon
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