Vinhos dos extremos do Chile: algumas impressões

Entender como os vinhos do Chile estão evoluindo em termos de estilo e qualidade. Esta foi minha proposta ao participar do evento organizado pela Wines of Chile e Anagrama. Além da degustação de vinhos de diversos produtores, foram duas Master Class, uma delas com o interessante tópico “Grandes vinhos dos extremos do Chile: os desafios de terroirs únicos”. A seguir minhas impressões sobre os exemplares apresentados.  

Lago Ranco Riesling 2019, Casa Silva 11,5%

Monovarietal de Riesling, elaborado a partir de uvas provenientes do vale de Osorno, na Patagônia chilena. Sem passagem em madeira, mostrou boa tipicidade da variedade, se mostrando um vinho “mais frio”, sem os excessos de fruta de vários Rieslings do Novo Mundo. Olfativo marcado por frutas brancas (pera), flores brancas, mineral no estilo salino e discreta nota de açúcar. Na boca, um vinho de boa acidez, denso e com textura cremosa, açúcar residual presente e alta tensão. R$ 260 em lojas online.

Talinay Caliza 2022, Tabali 12,8%

Um Chardonnay de alta gama, uma expressão de como esta variedade se adapta muito bem aos solos calcários (lembre-se de Chablis). As uvas são provenientes de uma parcela de apenas 0,7 hectare do vinhedo Talinay, a 12 quilômetros do Oceano Pacífico, na Valle de Limarí, norte do Chile. Olfativo intenso, com frutas brancas e muita salinidade, mostrou na boca alta acidez (8,6 de acidez total!), corpo médio e muita tensão, um vinho seco, linear, equilibrado e fresco, com notas cítricas e ótima profundidade. Um dos melhores brancos sul-americanos que já tive a oportunidade de provar. Produção de apenas 4.000 garrafas, sem preço no Brasil.

Tara Chardonnay 2021, Ventisquero 13%

Outro monovarietal de Chardonnay do norte do Chile, porém com uvas da região do Atacama, mais longe do Pacífico e com solos formados pela degradação dos Andes. E outro belíssimo vinho! No nariz, mostrou aromas de frutas de caroço e maresia, com alta acidez, corpo médio e muita textura (passa tempo com suas lias) no palato. Um vinho de muita densidade e elegância, delicioso e complexo, confirma a alta qualidade que alguns produtores conseguem obter com a Chardonnay no extremo norte do Chile. Preço de R$ 390.

Naranjo 2021, Ayllu 13%

Também da região do Atacama (Toconao), mais especificamente San Pedro del Atacama. Corte de 90% Moscatel de Alexandria e 10% Moscatel Rosado, com maceração e passagem por ânforas. Um vinho laranja “tradicional”, bem aromático (flor de laranjeira) tanto no olfativo como na boca, denso, untuoso e com certo açúcar residual.  Sem preço no Brasil.  

Pinot Noir Morandé Black Series 2021, Morandé 13,5%

Pinot Noir proveniente dos solos vulcânicos de Traiguén (centro-sul do Chile), 20% de cachos inteiros e 10 meses em carvalho (35% novo). Um vinho agradável, com frutinha vermelha bem intensa, floral e leve fumaça no nariz, com acidez média/alta, fruta abundante e leve nota sanguínea também no palato. Talvez tenha faltado um pouco de tensão, mas certamente um avanço em relação ao padrão “tradicional” de Pinot Noir no Chile. Também sem preço no Brasil.

Carignan Vigno 2020, Baron Philippe de Rotschild 13%

Apesar da safra mais quente, um monovarietal de Carignan agradável e de muita vivacidade, com uvas do Valle de Maipo. 30% de cachos inteiros e carvalho usado. Olfativo com frutas vermelhas picantes, especiarias (canela) e boa acidez, corpo médio e taninos presentes. Muita fruta picante também no gustativo, um vinho mais “selvagem” e, com toque de engaço. Sem preço no Brasil.

La Piu Belle 2020, VIK 14,5%

Fiquei na dúvida sobre que tipo de extremo este corte de 68% Carmenére, 23% Cabernet Sauvignon e 9% Cabernet Franc representa, pois tem uvas do Vale de Cachapoal. Representou o que chamo de “Chile convencional”, na forma de tintos encorpados, alcóolicos e excessivamente concentrados. Nariz intenso, marcado por aromas de blueberry, grafite, com leve toque de pirazina e álcool aparente. Na boca, acidez média, falta tensão e fruta compotada. Preço entre R$ 550 e 600.

Pewën de Apalta 2021, Santa Rita 14,2%

Com uvas provenientes de um vinhedo plantado em 1938 em Apalta, um Carmenére que tenta fugir do estigma desta variedade. O nariz se mostrou intenso, mas sem excessos, com notas de tabaco, frutas vermelhas, erva seca e alcaçuz. Mostrou no palato acidez e corpo médio, fruta mais doce (mas não geleia) e taninos presentes, trazendo notas herbáceas (5% a 9% de cachos inteiros), um Carmenére mais verde que frutado. Safras mais antigas na faixa de R$ 400.

Caballo Loco Gran Cru Sagrada Familia 2021, Valdivieso 14%

Corte bordalês “chileno” (25% Carmenére, 20% Petit Verdot, 18% Merlot, 17% Cabernet Franc, 10% Malbec, 10% Syrah) de estilo bem tradicional, mais um representante do “Chile convencional”. Fruta madura e borracha no nariz, com acidez e corpo médios, taninos presentes, combinando engaço e fruta doce na boca. Safras mais antigas também na faixa de R$ 400.

Heritage 2020, Concha y Toro 14,6%

Corte majoritário de Cabernet Sauvignon, com Cabernet Franc e uma pitada de Petit Verdot, com uvas do Vale de Maipo. Um vinho de safra quente, muito exuberante e intenso. No nariz, fruta vermelha bem madura, pimentão e couro. Já no palato, mostrou acidez média, muito corpo, fruta quase passada e muita concentração. Precisa de tempo, mas não creio que a falta de tensão e de acidez consigam em algum momento superar seu estilo fruit bomb. Preço na faixa de R$ 700.

Ketran 2017, Siegel 14,5%

Corte de Syrah (35%) Petit Verdot (30%), Carmenére (25%) e Cabernet Franc (10%), da região de Colchagua. Um vinho que em estilo lembrou os anteriores (encorpado e denso, com fruta madura), mas sem parte dos excessos vistos na maioria dos tintos provados anteriormente. Nariz com fruta vermelha e madura, fruta negra, chocolate, couro e pimenta do reino, com um palato mais equilibrado. Boa acidez, taninos mais resolvidos, amplo e com boa tensão, apesar de ser bem estruturado. Lembra mais Bordeaux que Chile, a fruta segue bem presente, mas sem ser enjoativo. Preço na faixa de R$ 850.

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