A procedência do degustador altera a pontuação do vinho?

Na hora de avaliar um vinho, a procedência do degustador altera a pontuação? Usos, costumes, memórias olfativas e gustativas de origens e locais distintos geram diferentes análises? A pontuação de um mesmo vinho é diferente segundo a procedência do degustador? Perguntas estas que um estudo de marketing da Universidade Concordia, no Canadá, foi atrás de responder, e publicou em 2019 o resultado que agora resumo.

A resposta: o estudo revelou que a procedência dos experts julgadores de vinhos provoca diferenças em seus critérios pessoais. A procedência do degustador altera a pontuação de um mesmo vinho. Ou seja, a pontuação de um mesmo vinho é distinta, segundo o lugar de origem do degustador.

Localização geográfica importa

A diferença de critérios entre os especialistas em vinhos pode ser motivada, em parte, pela região, segundo o estudo realizado. Parece que viticultores, sommeliers, jornalistas e outros especialistas em vinhos julgam e classificam os vinhos de maneira diferente dependendo de onde estão localizados.

A pesquisa constatou que a localização geográfica é um fator que afeta o julgamento dos apreciadores de vinho, assim como alguns atributos sensoriais do vinho, como equilíbrio e acidez. O estudo foi realizado em duas regiões canadenses com diferentes tradições de degustação de vinhos, Colúmbia Britânica e Quebec. Porém, pode ser extrapolado para qualquer país do mundo com regiões distintas.

Percepção diferente de sabores

“Descobrimos duas situações diferentes”, explica Bianca Grohmann, professora de marketing da John Molson School of Business em Concordia, coautora do estudo com Camilo Peña e Annamma Joy. “Isto tem implicações para o público em geral porque os consumidores não devem pensar que os especialistas em vinho têm uma só voz, mas que se distinguem e são influenciados pela sua localização e tradição”, diz Grohmann.

“Nosso trabalho mostra como os perfis de sabor são percebidos e recebidos de forma diferente em duas regiões, o que pode ser decisivo nas decisões de marketing”. As descobertas de Grohmann, publicadas recentemente no The Journal of Wine Research, observam que os especialistas em vinhos de Montreal detectaram mais acidez, amargor, carvalho, especiarias, pimenta verde, equilíbrio, sabor vegetal e tanino em comparação com o painel de Okanagan, na Colúmbia Britânica.

Curiosamente, ambos os grupos detectaram aroma de frutas vermelhas mais forte em vinhos completamente diferentes. Além disso, o painel de Okanagan pontuou maior qualidade quando detectou aromas mais picantes. Já o painel de Montreal colocou mais peso no equilíbrio de um vinho.

Modos distintos de analisar

Para o estudo, foram realizadas duas sessões de degustação às cegas de 60 minutos. Os participantes provaram sete garrafas de vinho tinto e avaliaram cada rótulo em sete atributos de aroma e nove atributos de sabor.

“Os profissionais do vinho na Colúmbia Britânica se inclinam para o modelo educacional do Reino Unido, baseado na certificação Wine and Spirit Education Trust (WSET)”, diz Grohmann. “Embora o painel de especialistas de Quebec tenha vindo da tradição dos sommeliers franceses e do jornalismo de vinhos, vemos essas diferentes origens educacionais e contextos socioculturais como importantes fatores de influência”.

As diferenças

Em provas às cegas, ambos os painéis concordaram que um Shiraz 2014 do sudeste da Austrália era o de melhor qualidade, com pontuação mais alta para ambos. No entanto, os especialistas discordaram sobre os outros vinhos, particularmente um dos vinhos da Califórnia. Provadores de Okanagan deram alta pontuação, enquanto os de Quebec deram pontos mais baixos. “Essa garrafa em particular é interessante porque foi projetada para transmitir bom gosto, em vez de ser um vinho de terroir“, explica Grohmann.

“Para comercialização e o marketing de vinhos, o conhecimento das diferenças no treinamento, nas avaliações sensoriais e nas preferências subsequentes do consumidor é fundamental, seja na distribuição direcionada ou no marketing direto”, conclui Grohmann.

Conclusões

Concluo explanando a minha interpretação, que, na verdade, vem de encontro ao que escrevo e falo há muito tempo. O que vale mesmo é o degustador ter “litragem”, ter participado de vários concursos com degustadores de todas as partes do mundo, e finalmente, suas impressões pessoais, com olfato e paladar com origem nas suas experiências, modo de vida, usos e costumes, locais e familiares.

Em uma família que sempre serviu alguma fruta local, ou mesmo alguma iguaria mais exótica como cérebro de boi, rins, dobradinha, os aromas e paladares são vivos na memória, enquanto outra que nada disso viu, viveu ou comeu, nada saberá.

Um dos aromas detectados no vinho como a jabuticaba, só é conhecido no Brasil, como algum europeu poderá saber distinguir, se não é fruta conhecida? O mesmo acontece com o famoso cassis, que nós brasileiros, apenas conhecemos o licor, mas não a fruta!

Até o próximo brinde!

Álvaro Cézar Galvão, conhecido como O Engenheiro Que Virou Vinho, me dedico a comentar, escrever, divulgar, dar palestras e ministrar cursos de vinhos, bebidas destiladas e a harmonização com a gastronomia. Assino, dentre outras mídias, o site Divino Guia www.divinoguia.com.br

A pesquisa foi apoiada pelo Conselho de Pesquisa em Ciências Sociais e Humanas do Canadá.

Fonte: Bianca Grohmann, Camilo Peña, Annamma Joy. Qualidade do vinho e avaliações sensoriais: os diferentes grupos locais de especialistas em vinhos diferem? Journal of Wine Research, 2018; 29 (4): 278 DOI: 10.1080/09571264.2018.1532882

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Fotos: Álvaro Cézar Galvão, arquivo pessoal

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