Gimblett Gravels: um universo à parte na vinicultura da Nova Zelândia

Desastres naturais geralmente trazem impactos negativos para a viticultura. Porém, existem exceções. E um deles acabou criando uma das mais disputadas áreas para o cultivo de videiras da Nova Zelândia: Gimblett Gravels. Este distrito da região de Hawke’s Bay ganhou fama nas últimas décadas como origem de alguns dos melhores vinhos tintos neozelandeses.

Se a Nova Zelândia é mais conhecida pelos seus vibrantes brancos de Sauvignon Blanc, que respondem por 78% da produção nacional de vinhos, e pelos seus intrigantes Pinot Noir, em Gimblett Gravels o cenário é totalmente distinto. Nos seus vinhedos o destaque fica com as variedades tintas originárias de Bordeaux, com destaque para a Merlot, além da Syrah, que na Nova Zelândia adota a grafia francesa, ao contrário do que ocorre na vizinha Austrália.  Vale a pena entender esta “interessante anomalia”.

Hawke’s Bay e seus distritos

Um breve histórico

Em 1867 um volume incomum de chuvas acabou gerando uma enorme enchente na área onde hoje se situa Gimblett Gravels. A intensidade foi tanta que o rio Ngaruroro acabou mudando o seu curso, criando o canal Omahu, do outro lado de uma colina chamada Roy’s Hill. Por conta disso, o curso antigo do rio, inteiramente coberto por material aluvial, acabou se tornando “terra firme”.

Porém, sendo por milênios o fundo de um rio deixou na área um perfil geológico único. Os solos são compostos por seixos de pequeno a médio porte, intercalados com camadas de lodo e areia que atingem uma profundidade de pelo menos 40 metros. Na linguagem da geologia do vinho, são os típicos solos aluviais, encontrados em diversas partes do mundo, com destaque para duas regiões em especial: Bordeaux e partes do Rhône.

O solo de Gimblett Gravels

O potencial desta área para a viticultura, porém, demorou muito a aparecer. O plantio das primeiras videiras se deu somente em 1981, nas mãos do visionário CJ Pask, da Pask Winery. Mesmo assim, esta área realmente ganhou maior importância somente vários anos depois. Em 1992, a área de vinhedos era de apenas 20 hectares, passando para 200 hectares em 2000 até atingir os atuais 850 hectares.

Um terroir especial

Mas o que diferencia Gimblett Gravels? Os cascalhos na superfície absorvem a luz solar e calor durante o dia, para irradiar calor à noite, aumentando a capacidade de amadurecimento das uvas. A estrutura pedregosa do solo permite uma drenagem muito rápida após chuvas, e esta baixa capacidade de retenção de água permite controlar o rendimento do vinhedo. Em paralelo, o baixo teor de argila no solo implica em pouca fertilidade, o que ajuda a manter o vigor da videira baixo a moderado. Tudo isso facilita a elaboração de vinhos de alta qualidade.

Embora a área de Gimblett Gravels seja quente para os padrões da Nova Zelândia, ela não é quente em um contexto mundial de vinhos. A combinação de altitude relativamente baixa e proximidade com o mar, mas protegida do efeito direto da brisa marítima, cria um clima marítimo temperado. Por conta da localização, altitude e aquecimento do solo pedregoso, Gimblett Gravel mostra as maiores temperaturas da região de Hawke’s Bay. Esta é uma característica quase única na Nova Zelândia, que tem seus vinhedos fortemente concentrados em uvas brancas ou tintas mais adaptáveis a climas frios.

Organização e uvas

A Nova Zelândia não adota o conceito de denominação de origem, porém, no caso de Gimblett Gravels, existe uma associação de produtores bastante ativa na defesa deste terroir único. A Gimblett Gravels Winegrowers Association (GGWA) foi criada em 2001 e é composta por 24 vinícolas. Elas podem adicionar Gimblett Gravels nos rótulos dos vinhos se um mínimo de 95% das uvas vier deste distrito. Vale lembrar que, sendo um distrito de Hawke’s Bay, as estatísticas de área de vinhedos e produção fazem parte daquelas da segunda maior região produtora de vinhos da Nova Zelândia

As uvas tintas representam cerca 90% dos vinhedos, atualmente lideradas pela Merlot (cerca de 35%), seguida por Syrah (20%), Cabernet Sauvignon (15%), Malbec (7%) e Cabernet Franc (4%). Os demais 10% são plantados com Chardonnay e Viognier, além de pequenas áreas de variedades aromáticas, incluindo Arneis, Gewürztraminer e Riesling.

Vinhos e produtores

Refletindo as variedades plantadas, dois estilos de vinhos representam muito bem o terroir de Gimblett Gravels: os cortes bordaleses e os monovarietais de Syrah. Em geral, são vinhos encorpados e expressivos, com excelente potencial de evolução. Seus vinhos de mais alta gama frequentemente aparecem entre os melhores tintos da Nova Zelândia. Entre os cortes bordaleses, destaque para Villa Maria Ngakirikiri, Mission Estate Jewelstone Antoine e Craggy Range Sophia. Já para os Syrah, vale a pena conhecer Trinity Hill Gimblett Gravels Syrah, Vidal Legacy Series Gimblett Gravels Syrah e Elephant Hill Stones Syrah.

Os produtores de Gimblett Gravels

Entre os principais produtores sediados ou com parcelas de vinhedos em Gimblett Gravels, destaque para nomes como Craggy Range, Mission Estate Winery, Villa Maria, Te Mata, Smith & Sheth, Trinity Hill, Elephant Hill, Stonecroft, Squawking Magpie, Vidal Estate e Saint-Clair.

Fontes: NZ Wines; NZ Wine Directory; The Gimblett Gravels; Decanter; Craggy Range; The Real Review

Mapas: New Zealand Wine, The Gimblett Gravels

Imagens: New Zealand Winegrowers Inc, Craggy Range;  @GIMBGRAVELS TWITTER

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