Givry: conheça a origem dos vinhos tintos mais elegantes da Côte Chalonnaise

Algumas denominações de origem da Borgonha são conhecidas pela sua alta proporção de vinhedos Premier Cru. E duas delas se situam na Côte Chalonnaise, sub-região que fica ao sul da Côte de Beaune: Givry e Montagny. Mas seria isso uma vantagem? Ao contrário do que possa inicialmente indicar, isso pode mais atrapalhar do que ajudar.

No caso de Givry, cerca de 45% da área de vinhedos é classificada como Premier Cru. São 38 climats com esta classificação, após uma controvertida decisão em 2010, que concedeu este status a mais 12 vinhedos. Para Jasper Morris, um dos maiores especialistas em Borgonha, isso é exagerado. Isso não significa, porém, que não existam vinhedos e, consequentemente, vinhos de alta qualidade em Givry. Assim, vale a pena conhecer melhor esta região, considerada uma das mais dinâmicas da Borgonha.

Localização e geologia

Givry está localizada na parte central da Côte Chalonnaise, a sudeste de Mercurey (que tem 100% de sua produção focada em vinhos tintos) e a nordeste de Montagny (que, por sua vez, produz 100% vinhos brancos). Dentre as cinco principais denominações de origem da Côte Chalonnaise, é a mais próxima da cidade de Chalon-sur-Saône, que dá nome à sub-região. A área da denominação de origem se estende por três communes:  Givry (com a grande maioria dos vinhedos), Dracy-le-Fort e Jambles.

Geologicamente, Givry, assim como outras áreas da Cote Chalonnaise, tem uma configuração que lembra muito mais a Côte de Beaune do que a sub-região do Mâconnais, que fica ao sul. São solos argilo-calcários, com origem no período jurássico. Boa parte dos vinhedos mostra orientações leste-sudeste ou sul, em altitudes entre 240 e 280 metros.

Tradição e realeza

A viticultura na região é muito antiga, com as primeiras evidências datando da época galo-romana. Porém, o principal impulso foi dado a partir da Alta Idade Média, por conta da forte atuação das ordens religiosas. A criação da Abadia de Cluny, localizada a cerca de 45 quilômetros ao sul de Givry, foi um marco importante.

Porém, foi a fundação do Cellier aux Moines, em 1130, que colocou Givry como o centro da vinicultura da Côte Chalonnaise. A influência dos monges cistercienses seguiu nos próximos séculos, mas ganhou a companhia também da realeza francesa. Evidências mostram que o Felipe IV (rei da França entre 1285 e 1314) teria oferecido vinhos de Givry a outros soberanos europeus. Porém, talvez o maior defensor dos vinhos da região tenha sido o rei Henrique IV (1589-1610). Ele considerava os tintos de Givry como seus vinhos favoritos.

Os vinhos preferidos de Henrique IV?

O longo apogeu dos vinhos de Givry teve fim. E isso ocorreu por conta de diversos fatores. A Revolução Francesa de 1789 resultou no fim das ordens religiosas e queda da monarquia, com consequência sobre propriedade e cultivo dos vinhedos. Já diversas pragas (míldio, oídio e, principalmente a filoxera) dizimaram os vinhedos no século XIX. A recuperação foi lenta e somente ganhou momento no século seguinte, sobretudo após a criação da denominação de origem, pouco depois do final da Segunda Guerra Mundial.

Denominação de origem

A área delimitada da denominação de origem Givry, criada em 1946, inclui cerca de 393 hectares, o que a coloca como a segunda menor da Côte Chalonnaise. Do total da denominação de origem, 215 hectares (55%) têm classificação Village e 178 hectares (45%) Premier Cru. Esta é a segunda maior proporção de vinhedos Premier Cru da sub-região, somente atrás de Montagny (58%). Da área plantada de 305 hectares, 82% são cultivados com Pinot Noir e os restantes 18% com Chardonnay, as principais variedades admitidas nesta denominação de origem.

A produção total média entre 2014 e 2018 atingiu 14,2 mil hectolitros, cerca de 17,5% da produção dos cinco villages da Côte Chalonnaise. Isso equivalente a 1,9 milhão de garrafas/ano, em linha com o produzido anualmente em Chassagne-Montachet. Deste total, 11,4 mil hectolitros (81%) correspondiam a vinhos tintos, com o restante brancos. A parcela maior era de vinhos de classificação Villages (54%), com os demais 46% recebendo a classificação Premier Cru.

Vinhedos e principais climats

No total, são 88 climats distintos, 58 dos quais classificados como Village e 38 como Premier Cru. Vale lembrar que alguns deles possuem parcelas classificadas como Village e outras como Premier Cru, o que explica a diferença na soma. Seus vinhedos Premier Cru (em laranja brilhante no mapa abaixo), podem ser divididos em três blocos distintos.

Os climats de Givry

Há um grupo principal de vinhedos nas encostas a oeste e norte do vilarejo, que concentra os climats historicamente associados a Givry. O segundo bloco é composto por alguns vinhedos a leste da rodovia D981, todos aprovados somente em 2010, muitos dos quais com parcelas classificadas também como Village. Por fim, há um terceiro grupo, espalhado no sudoeste de Givry.

O primeiro bloco é considerado como aquele com vinhedos de melhor qualidade para produção de vinhos tintos, com uma alta proporção de vinhedos originalmente murados (os chamados Clos), o que atesta sua longa tradição. Entre os principais vinhedos, destaque para Clos du Cellier aux Moines, Clos Salomon, Clos du Vernoy, Clos de la Baraude, Clos Saint-Paul, Les Boix Chevaux e La Servoisine.

Vinhos e principais produtores

Givry é conhecida como origem de alguns dos mais refinados e elegantes tintos da sub-região, o que historicamente levou alguns autores a chamar seus vinhos de “Volnay da Côte Chalonnaise”.  Seus vinhos brancos não gozam de tal reputação, embora existam Chardonnay minerais e de alta qualidade, como aqueles provenientes, por exemplo, do vinhedo Premier Cru Crausot.

Dentre os produtores sediados nesta denominação de origem, dois merecem destaque especial, até pelo trabalho realizado no plantio de clones de Pinot Noir mais adequados às condições da região. A Domaine François Lumpp tem longo histórico, enquanto a Domaine du Cellier aux Moines vem ganhando destaque, após sua aquisição pela família Pascal. Outros produtores que também merecem muita atenção são Domaine Joblot, Domaine du Clos Salamon e Domaine Laurent Mouton.

Fontes: Vins de Bourgogne; Wine Scholar Guild; Inside Burgundy, Jasper Morris; La Côte Chalonnaise – Atlas et Histoire des Noms de Climats et de Lieux, Marie-Hélene Landrieu-Lussigny e Sylvain Pitiot; Cahier des Charges de L’Appellation d’Origine Contrôlée Givry

Mapa: Vins de Bourgogne

Imagens: Arquivo pessoal

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