Indo além de Muscadet Sévre et Maine: conheça outras seis denominações do Pays Nantais

O Loire é o mais longo rio da França, com cerca de 1.000 quilômetros de extensão. E próximo à sua foz no Atlântico Norte, ficam algumas das regiões vinícolas mais ao norte do país, com um foco maior na elaboração de vinhos brancos. Concentradas ao redor da cidade de Nantes, existem seis denominações de origem diferentes, nesta região conhecida como Pays Nantais ou Baixo Loire. Um pouco mais distante fica uma sétima denominação, a Fief Vendéens AOC.

A mais conhecida destas AOC, sem dúvida alguma, é Muscadet Sèvre et Maine. Nela, reina absoluta a Melon de Bourgogne, originária, como o nome indica, da Borgonha, mas que atinge sua melhor expressão no terroir do Pays Nantais. Porém, em algumas das outras denominações de origem do Baixo Loire, outras variedades são também utilizadas como opção para a Melon de Bourgogne.

As sete denominações de origem

Boa parte destas denominações de origem mostra o domínio das uvas brancas. A Melon de Bourgogne concentra cerca de 74% dos vinhedos, seguida pela Chardonnay (7%) e Folle Blanche (6%). Mas uvas tintas também estão presentes, como a Gamay, com 5% da área de vinhedos, e a Cabernet Franc (3%).

Destas sete denominações de origem, quatro delas têm uma associação direta entre si, por concentrarem 100% de sua produção em vinhos elaborados a partir da Melon de Bourgogne. Muitas vezes são agrupadas sob o nome comum Muscadet, com uma hierarquia própria (regional, sub-regional e áreas com terroir mais homogêneo), descrita na figura abaixo.

Uma delas, Muscadet AOC, funciona como a base da pirâmide e também como uma espécie de guarda-chuva, se estendendo por uma área mais ampla. Já as outras três (Muscadet Coteaux de la Loire AOC, Muscadet Côtes de Grandlieu AOC e a já citada Muscadet Sèvre et Maine AOC) são sub-regiões dentro da Muscadet AOC, porém funcionam como denominações com identidades e regras próprias. Os Crus Communaux, por sua vez, não são denominações de origem, mas sim áreas dentro da Muscadet Sèvre et Maine AOC valorizadas pela presença de vinhedos mais homogêneos e de melhor qualidade.

Completando o grupo de sete denominações de origem da região do Baixo Loire, há outras três, que não têm na Melon de Bourgogne sua uva principal. Para conhecer melhor esta área fascinante, vale a pena detalhar cada uma destas denominações de origem.

Muscadet AOC

Apesar de se estender por uma região mais ampla, a denominação de origem Muscadet AOC não é a maior em termos de área de vinhedos. Como pode ser visto no diagrama abaixo, uma proporção elevada dos vinhedos dentro de sua área geográfica faz parte da Muscadet Sèvre et Maine AOC. Assim, com cerca de 1,500 hectares de vinhedos (a área cor de vinho no diagrama), ela inclui os vinhedos que não fazem parte das outras três. A produção anual média fica na faixa 85.200 hectolitros, o equivalente a 11,54 milhões de garrafas/ano.

Criada em 1937, esta denominação de origem se estende por 81 vilarejos, a maioria dos quais na margem esquerda do Loire. Ela cobre uma área que vai desde o Oceano Atlântico até Anjou e do rio Loire até a região de Vendée. Seus vinhos são 100% Melon de Bourgogne e se dividem em três estilos: Muscadet, Muscadet sur lie e Muscadet primeur. O primeiro estilo concentra vinhos mais leves, destinados quase que exclusivamente ao mercado local. O rendimento nos vinhedos pode chegar a 65 hectolitros por hectare.

Já os Muscadet sur lie tendem a ser mais cremosos e complexos, elaborados a partir de vinhedos com rendimentos máximos de 55 hl/ha. Por sua vez, os Muscadet primeur são vinhos básicos e mais frutados, geralmente engarrafados somente dois meses após a safra. Por conta disso, muitas vezes é feita a comparação com os Beaujolais Nouveau.

Área da Muscadet AOC, em azul

Muscadet Coteaux de la Loire AOC

A criação desta denominação de origem ocorreu em 1936 e ela conta atualmente com cerca de 172 hectares de vinhedos, espalhados por 22 vilarejos nas duas margens do Loire. Ela fica no quadrante nordeste da denominação Muscadet AOC, em torno do vilarejo de Ancenis. É a menor das três sub-regiões e, também, a mais distante do mar. Conta com maiores elevações, o que explica a menor participação de colheita mecanizada em relação às demais. Seus solos são basicamente compostos por xisto, gneis e xisto micáceo. Isso reflete sua posição no Maciço Armoricano (terreno muito antigo de origem vulcânica, que aflorou há mais de 300 milhões de anos).

Área da Muscadet Coteaux de la Loire AOC

Assim como as demais denominações Muscadet, a Melon de Borgogne é uva primária, com rendimentos máximos de 55 hl/ha. Por conta da composição dos solos da região, seus vinhos são muitas vezes considerados mais estruturados e potentes que outras sub-regiões, com aromas florais e notas minerais, lembrando fósforo. A produção anual média fica na faixa 6.100 hectolitros, ou algo em torno de 815 mil garrafas/ano.

Muscadet Côtes de Grandlieu AOC

Esta denominação de origem, aprovada em 1994, é a mais recente dentre as quatro Muscadet. Cobre uma área de 220 hectares, espalhados por 19 communes na margem esquerda do Loire, ao redor do Grand-Lieu, um dos maiores lagos da França. Esta área fez parte da Muscadet AOC entre a Segunda Guerra Mundial e 1994, e está situada a sudoeste de Nantes. Possui solos mais variados, incluindo rochas ígneas e metamórficas do Maciço Armoricano, como gneiss, xisto micáceo, gabbro, anfibolito e granito.

Área da Muscadet Côtes de Grandlieu AOC

Seus vinhos, também compostos por 100% de Melon de Bourgogne, refletem as características de seu terroir. É uma região mais plana e próxima do mar, que mostra menor variação térmica. Em geral, são vinhos com destacadas notas de frutas amarelas e toque salino. A produção anual média fica na faixa 9.600 hectolitros, o equivalente a 1,3 milhão de garrafas/ano.

Gros Plant du Pays Nantais AOC

Se as quatro denominações Muscadet incluem os vinhedos plantados como Melon de Bourgogne, a Gros Plant du Pays Nantais AOC também foca em uma variedade branca. No caso, porém, a uva principal é a Folle Blanche. Chamada localmente de Gros Plant, esta variedade originária do sudoeste da França tem uma longa história no Baixo Loire. Foi introduzida por mercadores holandeses, com objetivo de elaborar destilados. Ao lado da Folle Blanche, que é a uva primária (ao menos 70% da composição), as regras da AOC aceitam também proporções menores de Colombard (máximo de 10%) e Montils, que são consideradas uvas acessórias.

Área da Gros Plant du Pays Nantais AOC

A Gros Plant du Pays Nantais AOC se entende por uma vasta área, não muito diferente em termos de tamanho da Muscadet AOC. No entanto, a área de vinhedos, que segue em queda, não ultrapassa atualmente 540 hectares, espalhados por 92 vilarejos. Até por conta de sua história, até hoje permite rendimentos máximos bastante altos, na faixa de 70 hl/ha. São vinhos com aromas cítricos e de flores brancas que, quando elaborados pelo método sur lie (atualmente cerca de 1/3 da produção), ganham mais textura e complexidade.

Por conta da alta produtividade desta uva, geralmente os melhores vinhos provêm de vinhedos com solos mais pobres, que limitam o vigor das videiras. Dentre eles, destaque para os vinhedos plantados em encostas nas áreas de Sèvre et Maine e Granlieu. A produção anual média desta denominação de origem é de cerca de 31.000 hectolitros, o equivalente a 4,1 milhões de garrafas/ano.

Coteaux d’Ancenis AOC

Se a Gros Plant du Pays Nantais AOC cobre uma área não muito distinta da Muscadet AOC, o mesmo ocorre entre as denominações de Coteaux d’Ancenis AOC e Muscadet Coteaux de la Loire AOC. Neste caso, ao invés da Melon de Bourgogne, as uvas primárias são Pinot Gris (chamada localmente de Malvoisie) e Gamay (que responde por cerca de 65% da área de vinhedos desta AOC). Até 2011 estes vinhos eram classificados como VDQS (Vin Délimité de Qualité Supérieure). Desde então, porém, fazem parte desta AOC, refletindo as mudanças estruturais na classificação de vinho na União Europeia.

Área da Coteaux d’Ancenis AOC

É uma área de longa tradição na vinicultura. Em 1573, a cidade de Ancenis já tinha reputação como um grande mercado de vinhos das margens do Loire, com o rei Charles IX autorizando uma série de négociants de vinhos na área portuária da cidade. No total, são 200 hectares de vinhedos, predominantemente em solos de xisto, cobrindo 22 vilarejos em ambas as margens do Loire. A produção anual média é de aproximadamente 7.300 hectolitros, que equivale a 973 mil garrafas, divididas entre brancos (rendimento máximo de 50 hl/ha) e tintos e rosés (60 hl/ha)

Fief Vendéens AOC

Esta é uma região mais distante de Nantes, mais de uma hora de carro na direção sul. Esta denominação de origem, aprovada em 2011, também era uma VDQS. Ela inclui cinco áreas ao redor dos vilarejos de Brem-sur-Mer, Mareuil-sur-Lay-Dissais, Chantonnay, Pissotte e Vix, para um total de 18 vilarejos. Cada uma destas cinco regiões tem características distintas, embora cerca de 80% dos vinhedos desta AOC sejam plantados com uvas tintas e haja regras incentivando que os vinhos sejam cortes.

As cinco áreas da Fief Vendéens AOC

Cada região desta AOC tem regulamentos diferentes. No caso dos tintos (35% da produção), todas as cinco regiões exigem que a Négrette tenha presença de ao menos 10% no corte. Em Brem e Pissote, a Pinot Noir deve ter participação mínima de 40%, enquanto em Mareuil, Chantonnay e Vix esta é exigência mínima de Cabernet Franc. Os rosés, por sua vez, devem incluir ao menos 50% de Pinot Noir e Gamay, com um mínimo de 40% de Pinot Noir nas regiões onde ela é exigida para tintos, com a mesma exigência para Gamay nas demais. Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc e Négrette também podem ser usadas.    

Já os vinhos brancos (menos de 20% do total) devem conter ao menos 60% Chenin Blanc e 10% Chardonnay, sempre em estilo seco. Brem permite a adição de Grolleau Gris, enquanto Vix adota a Sauvignon Blanc. Em termos de área de vinhedos, a maior delas é Mareuil-sur-Lay-Dissais, com cerca de 330 hectares de vinhedos, seguida por Brem-sur-Mer (80 ha), Vix (40 ha), Chantonnay (25 ha) e Pissotte (24 ha).

Fontes: Vins Val de Loire; Loire Master-Level Study, Wine Scholar Guild; The Wine Doctor; Muscadet Toward a Renaissance, Jo Landron; Wines and Top Vineyards – The Loire 2022, Benjamin Lewin MW

Mapas: Vins Val de Loire

Imagem: Emeline Boileau/Vins de Nantes

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