O Antis e o Depois. Há diferenças ao degustarmos o mesmo vinho mais de uma vez. Esta frase pode receber uma interrogação ao final: há diferenças ao degustarmos o mesmo vinho mais de uma vez? Mas também pode receber uma exclamação: há diferenças ao degustarmos o mesmo vinho mais de uma vez! Tudo vai depender de algumas condições, tais como quanto tempo decorre entra as degustações, o vinho é da mesma safra (para ser o mais corretos possível), a guarda do vinho foi bem feita … e por aí vamos.
A resposta também poderá receber variadas pontuações ao final: a diferença que sentimos aos degustar o mesmo vinho em ocasiões distintas! Ou mesmo um verbo a mais: há diferença que sentimos aos degustar o mesmo vinho em ocasiões distintas.
Metamorfose ambulante
Sem mais elucubrações, vamos à parte prática do assunto. O Antis e o Depois (há um trocadilho também aqui). Começo dizendo que estas ocasiões nos levam a pensar que se a safra ou safras forem as mesmas, mesmo assim, os vinhos contidos nas garrafas não serão os mesmos, e acreditem, nem nós o seremos. Envelhecemos, aprendemos, mudamos, melhoramos em alguns itens, podemos piorar em outros, o mesmo acontece com os vinhos já engarrafados. Em que condições foram guardados estes vinhos? Em quais condições vivemos durante o tempo percorrido entre uma e outra degustação?
Sofremos fisicamente alterações sempre, mesmo que imperceptíveis muitas das vezes, o mesmo acontece com os vinhos. Quando os degustamos pela primeira vez, estávamos confortavelmente sentados ou de em pé? Demos tempo para o vinho respirar? E na outra ocasião, aconteceu o mesmo?
As taças eram boas em ambas ocasiões? Tantos questionamento para dizer que sim, há diferenças notadas na degustação de um mesmo rótulo e safra em ocasiões diversas. O vinho envelhece, nós envelhecemos. Aprendemos mais, sentimos outros aromas e gostos. Para exemplificar, degustei um rótulo, no caso argentino, mas poderia ser qualquer origem, safra 2004 em 2008, e anotei seus parâmetros sensoriais.
2008 vs 2021
Em 2008 anotei: corte das uvas Merlot, Malbec e Cabernet Sauvignon, com 14 meses em barricas de carvalho francês de primeiro uso, o Antis Reserve Cuvée Mendoza 2004 apresenta bastante corpo e intensa coloração rubi púrpura. Com aroma profundo de ameixas maduras e frutas vermelhas, na boca apresenta camadas de frutas escuras maduras e cacau. É muito bem balanceado, com taninos equilibrados e um longo e prazeroso final.
Já em 2021 anote: Antis Reserve Cuvée Mendoza 2004, vinho guardado em minha adega há anos, já estava dando sinais de “cansaço” na rolha. Abri e tive grata surpresa, o Antis estava muito bom ainda. Corte de 55% Merlot, 40% Malbec e 5% Cabernet Sauvignon, passagem por barricas de carvalho francesas novas por 14 meses. Álcool 14,5%, vinho comprado à época da Porto Mediterrâneo, que não mais opera no mercado.
Diferenças fazem parte
A acidez, confesso, que já não estava tão marcante. Mas os taninos, ainda bem sentidos, e o álcool ajudaram na longevidade de quase 18 anos, além das uvas robustas do corte. A fruta que mais apareceu foi a ameixa preta, principalmente em compotas e/ou geleias. Especiarias variadas, e os empireumáticos, ou seja, os aromas originados das barricas e os terciários bem presentes.
A cor, de imediato quando abri, estava turva e meio atijolada. Mas o brilho e a cor rubi escura voltaram com a oxigenação. Os taninos ainda presentes e o álcool equilibrados. O frutado e as especiarias surgiram bem depois, tornando o vinho muito interessante, mesmo com toda a idade.
Este texto é para mostrar que podemos, sim, ter diferenças ao degustarmos o mesmo vinho, da mesma safra anos depois, mas com todas as premissas iguais em ambas as ocasiões, ao sermos justos sensorialmente.
Até o próximo brinde!
Álvaro Cézar Galvão, conhecido como O Engenheiro Que Virou Vinho, me dedico a comentar, escrever, divulgar, dar palestras e ministrar cursos de vinhos, bebidas destiladas e a harmonização com a gastronomia. Assino, dentre outras mídias, o site Divino Guia www.divinoguia.com.br
Disclaimer: Os conteúdos publicados nesta coluna são da inteira responsabilidade do seu autor. O WineFun não se responsabiliza por esses conteúdos nem por ações que resultem dos mesmos ou comentários emitidos pelos leitores.
Fotos: Álvaro Cézar Galvão, arquivo pessoal
O post O Antis e o Depois apareceu primeiro em Wine Fun.