Petit Chablis: uma expressão mais leve e fresca da Chardonnay

Chablis é o principal vilarejo de uma das mais fascinantes regiões produtoras de vinhos da Borgonha, com foco exclusivo na Chardonnay. Na hora de classificar seus vinhos, esta região manteve a estrutura básica da pirâmide hierárquica borgonhesa: vinhedos regionais, Village, Premier Cru e Grand Cru. No entanto, há uma diferença em relação aos vilarejos da Côte d’Or. No caso de Chablis, existem duas denominações de origem Village distintas: Chablis e Petit Chablis.

E qual o motivo desta diferença? Existe alguma hierarquia (formal ou informal) entre elas? Para responder estas perguntas, é preciso conhecer um pouco de geologia e história, além de compreender melhor as mudanças significativas que esta parte da Borgonha vivenciou nos últimos cinquenta anos.

O peso da geologia

É difícil negar que, em Chablis, a geologia tenha tido um peso mais importante do que na Côte d’Or. Se no que é chamado de o “coração da Borgonha”, a composição dos solos traz um maior equilíbrio entre argila e calcário, em Chablis os solos calcários reinam soberanos. De fato, a composição dos solos de Chablis é muito mais próxima daqueles da Champagne ou de Sancerre, do que dos de Beaune ou Nuits-Saint-Georges.

Na região de Chablis existem dois tipos de solos dominantes, ambos com alta proporção de calcário, mas de eras e características diferentes. Os mais conhecidos são os solos Kimmeridgianos, criados a cerca de 155 milhões de anos e com alta incidência de conchas marinhas. Porém, existem solos um pouco mais jovens (150 milhões de anos), que são mais duros e menos permeáveis. São os solos Portlandianos, também conhecidos como calcários de Barrois.

Estes últimos estão concentrados sobretudo em platôs que ficam nas áreas mais altas da região de Chablis, entre 230 e 280 metros de altitude, diretamente acima dos solos Kimmeridignianos. Porém, por conta de fenômenos naturais, sobretudo erosão, é possível encontrar o calcário de Barrois também em menores altitudes.

Definindo terroir

Foi nesta diferença de solos que os primeiros esforços para segmentar os vinhedos de Chablis se basearam. Já no início do século XX, os produtores da região se reuniram em um sindicato, para defender a tipicidade dos vinhos da região. Optaram por classificar como Chablis somente os vinhos elaborados a partir da Beanois (como a Chardonnay é chamada na região) proveniente de solos Kimmeridigianos. Já os vinhos produzidos a partir de outras uvas brancas ou tipos distintos de solos passaram a ser chamados de Petit Chablis.

A denominação de origem Chablis foi criada em 1938, seguindo estes princípios. Foi somente em 1º de janeiro de 1944 que houve a aprovação da denominação Petit Chablis, porém, incluindo somente vinhos elaborados a partir da Chardonnay. Esta definição baseada na geologia, todavia, seguiu gerando controvérsias nas décadas seguintes. Outras variáveis, como orientação dos vinhedos, também passaram ao centro da discussão.

Os vinhedos da região de Chablis

Expansão e novos critérios

A pressão para a expansão da área da denominação de origem Chablis trouxe alterações nas regras decididas previamente. A aprovação de uma área muito maior para Chablis em 1978 foi baseada não somente no perfil de solos, mas levou também em conta os diversos microclimas, a orientação dos vinhedos e outros fatores. O resultado foi que alguns vinhedos anteriormente classificados como Petit Chablis foram “promovidos” para a denominação Chablis.

A grande expansão da área de Petit Chablis veio depois disso. Em 1970 havia 128 hectares de área plantada, que caiu para 110 hectares em 1980, por conta da decisão de 1978. A partir daí, porém, o que se viu foi uma rápida expansão: dos 259 hectares de 1990, a área de videiras superou o patamar de 1.000 hectares na década de 2010.

Por conta desta expansão, hoje não faz mais sentido identificar a diferença entre Chablis e Petit Chablis somente por conta da geologia. De fato, grande parte dos vinhedos de Petit Chablis está situada nos platôs de maior altitude, mas há também áreas em encostas mais baixas ou mesmo em solos argilosos ou aluviais.

Vinhedos e produção

A denominação de origem Petit Chablis contava em 2018 com uma área de 1.108 hectares de vinhedos, a segunda maior da região, somente atrás de Chablis, que somava 3.656 hectares. A produção média ficava na faixa de 59 mil hectolitros de vinho ao ano, o equivalente a 7,8 milhões de garrafas ao ano. A única variedade permitida continua sendo a Chardonnay.

Apesar de ser uma denominação de origem completamente independente de Chablis, as regras mostram grandes semelhanças, inclusive no que diz respeito à definição dos rendimentos máximos.  Tanto em Petit Chablis como em Chablis o rendimento máximo é de 60 hectolitros por hectare. Isso é ligeiramente superior às denominações Villages da Côte d’Or, onde fica na faixa de 57 hl/ha.

Os vinhos

Como descrever os vinhos de Petit Chablis, sobretudo na comparação com aqueles de Chablis? Embora sejam denominações de origem independentes, há uma certa hierarquia formal entre elas. Os produtores de Chablis podem optar por classificar seus vinhos como Petit Chablis, mas não vice-versa.

Em geral, os vinhos de Petit Chablis são mais frescos e leves, com coloração amarelo palha e reflexos verdeais, notas cítricas e de flores brancas, toque mineral, alta acidez e corpo médio. A grande maioria dos vinhos desta denominação de origem é elaborada sem passagem por madeira, garantindo maior tensão e frescor. No entanto, como em qualquer denominação de origem, é difícil generalizar em termos de qualidade.

Existe uma enorme diversidade de terroir (sobretudo orientação e condições microclimáticas) entre os diversos vinhedos, o que implica em vinhos de características distintas. Por exemplo, os Petit Chablis de produtores como Vincent Dauvissat são elaborados com uvas de parcelas logo acima dos vinhedos Grand Cru de Chablis. Isso garante maior estrutura e potencial de guarda, desmentindo o mito de que todos os Petit Chablis são vinhos somente para consumo imediato.

Principais produtores   

Além de Vincent Dauvissat, praticamente todos os grandes produtores de Chablis também elaboram vinhos classificados como Petit Chablis. Não faltam outros produtores de alto calibre, como Domaine François Raveneau, Domaine William Fèvre, Domaine Billaud-Simon, Domaine Christian Moreau e Domaine Jean-Paul & Benoit Droin.

Fontes: Vins de Bourgogne; Wine Scholar Guild; Inside Burgundy, Jasper Morris; Cahier des Charges de L’appellation d’origine Petit Chablis; The World Atlas of Wine, Hugh Johnson; The New French Wine: Redefining the World’s Greatest Wine Culture, Jon Bonné

Mapa: Vins de Bougogne

Imagem: Arquivo pessoal

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