Vinhedos de cultivo sustentável: um passo importante para um mundo mais verde ou apenas uma jogada de marketing?

Mais do que quantidade, parece que o foco da vinicultura mundial nas últimas décadas tem sido a qualidade. Se no passado produzir muito vinho parecia um ótimo negócio para as vinícolas, hoje em dia o quadro é mais complexo. A diferença de preços entre vinhos mais simples e aqueles de melhor qualidade não para de crescer, trazendo um importante componente financeiro para a busca de maior qualidade.

O resultado é que os produtores cada dia investem mais pesado em produzir vinhos melhores. E não há como fazer um vinho de alta gama sem que as uvas utilizadas sejam de ótima qualidade. O maior cuidado dos vinhedos, anteriormente restrito a produtores mais artesanais, passou a ser um dos focos principais também dos grandes produtores nas últimas décadas.

Busca de uma viticultura mais consciente

Parece haver consenso atualmente que não há mais espaço para a produção de vinhos de alta qualidade a partir de vinhedos cultivados com a agricultura convencional. Se o uso indiscriminado de herbicidas, pesticidas e fertilizantes sintéticos conquistou adeptos no passado, ficou claro que seus efeitos de longo prazo sobre os vinhedos e o meio ambiente são extremamente negativos.

Muitos produtores, desde pequenos agricultores artesanais até ícones da indústria, como Domaine de la Romanée Conti, Domaine Leroy, Château Angelus, Ridge Vineyards ou Fontodi, escolheram os rumos da agricultura orgânica ou biodinâmica. Nestes casos, o uso de herbicidas, pesticidas e fertilizantes sintéticos é estritamente banido. Este é um segmento que vem crescendo rapidamente, com a área de vinhedos plantados de acordo com os princípios da agricultura orgânica crescendo mais de 110% entre 2010 e 2019 ao redor do mundo, sobretudo na Europa.

Por outro lado, existe um grupo bastante numeroso que optou pela chamada agricultura sustentável, onde existe um compromisso no sentido de reduzir os insumos sintéticos, porém sem uma regra formal de não utilização. Neste caso, o produtor opta pelo que for melhor, sobretudo se condições climáticas aumentarem a possibilidade de proliferação de doenças nos vinhedos.

Realidade ou jogada comercial?

A agricultura sustentável, porém, está no centro de uma grande polêmica. Por um lado, há aqueles que defendem que ela representa um importante progresso no sentido de uma agricultura mais consciente, sem tirar do viticultor opções vistas como importantes na hora de cultivar seus vinhedos. Já de outro, não faltam aqueles que acreditam que a agricultura sustentável não passa de uma jogada comercial, ou green washing, usando a expressão mais utilizada.

Uma iniciativa que gerou muita controvérsia é o selo HVE, criado em 2012 a partir de uma série de ações do governo francês para garantir maior sustentabilidade à viticultura local. Após ter sofrido importantes mudanças em relação ao projeto inicial, a visão de muitos viticultores franceses é que este selo pouco acrescenta, sendo inclusive centro de uma disputa judicial que sacudiu a região de Bordeaux.

Falando de sustentabilidade

No mundo dos negócios, medir a sustentabilidade significa adotar padrões de sustentabilidade econômica, social e ecológica. No mundo do vinho, embora programas de sustentabilidade como os da Nova Zelândia sejam mais amplos, o mais comum é focar em sustentabilidade ecológica.

Mas, falando em ecologia, como definir o que é sustentável? O que deve ser sustentável e em que escala e em que forma? Qual a escala de tempo para definir o que é sustentável: um vinhedo pode ser cultivado por 20, 100 ou 500 anos antes que seus recursos sejam esgotados? São questões difíceis de responder, até porque a chamada sustentabilidade econômica tem um foco muito restrito ao curto prazo. Não é à toa que vivemos um intenso período de aquecimento global.

Análise mais criteriosa

A discussão em relação à sustentabilidade e, particularmente à agricultura sustentável, é, portanto, ampla e profunda. Mesmo modelos de agricultura como orgânica e biodinâmica também são alvo de críticas. O chileno Pedro Parra, um dos maiores especialistas em solos do mundo, declarou que já se deparou com vinhedos de solos degradados apesar do uso de técnicas orgânicas e biodinâmicas. No caso da agricultura sustentável, esta questão ganha ainda maior peso, por conta do uso de insumos sintéticos.

Qual a conclusão? Será que estes selos realmente têm algum valor no sentido de indicar que práticas mais sustentáveis são adotadas? Para responder esta pergunta, o melhor é trabalhar com probabilidades. Práticas agrícolas mais naturais, como biodinâmica ou orgânica, tendem a mostrar maior probabilidade de produzir uvas de melhor qualidade e, dependendo obviamente do talento do enólogo, vinhos melhores.

Já em relação aos produtores que adotam agricultura sustentável, esta pergunta é mais difícil de responder, até porque eles dispõem de uma margem de manobra muito grande na hora de utilizar insumos químicos. De um lado, há aqueles que usam estas substâncias apenas em condições extremas, onde há grande risco de perder uma parte significativa da produção. Já outros, por sua vez, parecem dar razão às vozes que afirmam categoricamente que agricultura sustentável não passa de green washing para obter preços melhores e iludir o consumidor. A grande questão é saber de qual lado o produtor do vinho que você comprou fica. E isto involve pesquisa e confiança.

Fonte: Wine Scholar Guild; Wine.co.za

Imagem: JuergenPM via Pixabay

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