Vinhos doces e de sobremesa: conheça os campeões em concentração de açúcar

Uma das tendências mais claras no mundo do vinho é a crescente preferência por vinhos secos. Se no passado os vinhos doces desempenhavam um papel central nas adegas e taças de enófilos e consumidores, atualmente o que se vê é uma rápida e inexorável redução do seu consumo. E isso afeta muitos vinicultores e regiões tradicionalmente envolvidos com sua produção.

Esta tendência não se restringe somente aos vinhos secos. O mesmo acontece com os espumantes, em especial os Champagnes. Atualmente, grande parte dos Champagnes consumidos no mundo mostra níveis de açúcar residual de até 12 gramas por litro (g/L), que correspondem às categorias Brut Nature, Extra-Brut e Brut. No passado, porém, isso era muito diferente.

A descoberta de um naufrágio no Mar Báltico, contendo uma carga de garrafas de Champagne da safra 1839, evidencia o quanto os gostos mudaram. Na média, os Champagnes da época mostravam grau de açúcar residual na faixa de 140 a 150 gramas por litro. No caso das garrafas destinadas ao mercado russo, um dos maiores destinos destes espumantes na época, o nível chegava a 300 g/L.

Açúcar e acidez

Olhar somente para o grau de açúcar residual, porém, merece cautela. Como em tudo que consumimos, o nível de acidez também deve ser levado em consideração. É a combinação entre acidez e açúcar que afeta a nossa percepção de dulçor. Não é à toa que duas das variedades mais famosas pelos seus vinhos doces, Riesling e Chenin Blanc, ficam dentre aquelas com maior acidez.

Obviamente, a percepção de equilíbrio entre acidez e dulçor não se restringe somente ao vinho. A Coca-Cola, que tem um pH similar ao de um limão-taiti, faz um grande sucesso como “bebida refrescante”, apesar de mostrar um teor de açúcar na faixa de 113 gramas por litro. Ou seja, para cada litro deste refrigerante que você beber, estará ingerindo mais de 100 gramas de açúcar equivalente.

Voltando ao mundo do vinho, a variação de acidez entre os vinhos, porém, não é tão grande. Em geral, a acidez total dos vinhos varia entre 5,5 e 8,5 g/L (embora haja vinhos fora desta faixa). Uma rápida comparação com o enorme intervalo de variação do açúcar residual descrito anteriormente deixa claro porque é o açúcar que realmente faz a diferença na nossa percepção de dulçor, ao menos nos casos mais extremos.

O que seria um vinho doce?

E como podemos classificar os vinhos de acordo com seu grau de açúcar residual? Não existe uma classificação formal, até por conta das diferenças entre tradições de diversas regiões e dos próprios níveis de acidez. Porém, convencionalmente, aqueles vinhos com açúcar residual de até 1 g/L podem ser considerados muito secos, enquanto aqueles com até 17 g/L são descritos como secos.

Níveis entre 17 a 35 g/L dão origem aos vinhos off-dry, com o patamar entre 25 e 120 g/L sendo destinado aos semi-doces. Caso este nível de açúcar seja superado, estamos falando de vinhos doces. Porém, como mencionado acima, há enormes diferenças regionais no que diz respeito à classificação de dulçor. No Brasil, um vinho é dito seco quando contém até 4 g/L, meio-seco entre 4,1 e 25 g/L e suave ou doce acima disso.

Já na Alemanha, que classifica os vinhos também por açúcar residual (uma de suas diversas classificações), um Trocken (seco) deve ter menos que 9 g/L. Os níveis seguintes são Halbtrocken (semi-seco), entre 9,1 a 15 g/L, Liebliche (15,1 a 45 g/L) e Süss (acima de 45 g/L). Em poucas palavras, definir o que é um vinho doce, semi-doce ou doce é um exercício que depende de muitas variáveis, sobretudo onde você mora e qual a origem dos vinhos.

Açúcar no limite

No caso da elaboração de vinhos doces, é muito comum que as denominações de origem determinem um nível mínimo de açúcar residual para que o vinho possa ser engarrafado usando o nome da denominação. Porém, é usual que os vinhos acabem superando estes níveis, até porque no passado, maiores níveis de açúcar no mosto ou nos vinhos podiam indicar vinhedos de melhor qualidade. Um exemplo fica com os Pedro Ximenez, vinhos elaborados na região de Jerez a partir de uvas de mesmo nome. A regra determina um patamar de açúcar residual mínimo de 212 g/L, mas os vinhos, em geral, mostram níveis na faixa de 300 a 400 gramas por litro.

Em outras regiões, como no Jura, a regulamentação exige um grau mínimo de álcool. Por exemplo, para ser engarrafado como Vin de Paille, o vinho deve mostrar um grau mínimo de 14% de álcool, resultando em níveis de açúcar residual que geralmente variam entre 60 a 130 g/L. Porém, há produtores que decidiram não seguir as regras, apostando em vinhos mais doces. A cuvée Spirale, elaborada pela Domaine Bénédicte e Stéphane Tissot, mostra 8% de álcool e 300 g/L de açúcar, por conta da decisão do vinhateiro de interromper a fermentação.

Mas o campeão em termos de açúcar residual parece ser o húngaro Tokaji Esszencia. Suas regras de produção determinavam um patamar mínimo de 250 gramas de açúcar por litro até 1997, mas foram alteradas para 450 g/L desde então. O resultado? Vinhos que atingem extremos de até 900 gramas de açúcar por litro. Você não leu errado: em cada garrafinha de 375 mililitros, o açúcar residual pode chegar a 337 gramas. É algo que você alcançaria bebendo quase três litros de Coca-Cola. 

Outros exemplos

Porém, nem todos os vinhos doces chegam a tais extremos. Por exemplo, um Tokaji 5 Puttonyos necessita ter ao menos 120 g/L de açúcar. Já a versão ligeiramente mais doce e concentrada deste vinho húngaro de sobremesa, o 6 Puttonyos, deve mostrar mais que 150 g/L de açúcar. Os vinhos de Sauternes, por sua vez, mostram níveis entre 120 e 220 g/L, com seu representante mais prestigioso, o Château d’Yquem, contendo entre 120 e 150 g/L.

O Passito di Pantelleria, vinho símbolo desta ilha italiana, em geral contém entre 150 e 180 g/L, acima do piso mínimo de 100 g/L determinado pela sua denominação de origem. No caso do Porto Vintage, o patamar médio fica em torno de 100 g/L, enquanto os Madeira Malmsey (os mais doces nesta denominação) variam entre 65 e 120 g/L.

Por fim, o nível de açúcar residual médio dos Iceweins fica entre 160 e 320 g/L, acima do patamar mínimo obrigatório de 120 g/L. Já os Trockenbeerenauslesen alemães devem ter ao menos 150 g/L, mas não é incomum encontrar vinhos com açúcar residual acima de 220 g/L.

Fontes: German Wines; Taste Hungary, Triple AAA; Jura Wine, Wink Lorch; The Wine Bible, Karen MacNeil

Imagem: EuamoBrasil via Pixabay

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